sábado, 24 de setembro de 2011

IN SKÉNÉ


Professora Doutora Maria Luisa Malato

Professora Associada com Agregação

Faculdade de Letras da Universidade do Porto

Áreas de investigação: Literatura portuguesa (séculos XVIII/XIX); Literatura Comparada; Teoria da Literatura; Retórica.


A “skéné”, palavra grega hoje traduzida por “cena”, palco ou episódio divisível do acto, pouco tinha a ver com estes significados, pelo menos no século V a. C..


Era um lugar, delimitado no espaço: uma “tenda”, um “tabernáculo”. Estava vedada aos olhos dos espectadores, por detrás do “proskénion” (o estrado onde actuavam os actores, no centro da “orchestra”). Devia servir para os actores trocarem de adereços.

É provável que, ao longo da Idade Média, pouco se possa dizer dos edifícios de teatro, até porque estavam demasiado conotados com a decadência moral e intelectual atribuída aos espectáculos pagãos. Quando a partir do século XVI, em Itália, se voltaram a construir teatros (marcados pela interpretação que Palladium fez da obra de Vitrúvio), o espaço foi fechado por uma abóbada, o estrado dos actores subiu progressivamente e o espaço do público afunilou em U, associando-o teatro, talvez só funcionalmente, à estrutura de uma catedral. Mas no “teatro à italiana”, a partir do século XVII, a “caixa de cena” é um espaço neutro que progressivamente se abre ou fecha em dois volumes, um para máquinas e outro para cortinas. A “cena”, reconstruída segundo as leis da perspectiva, é agora a totalidade de um espaço de ilusão, existe para que o espectador pense que está numa floresta, numa cidade, numa sala. A “boca de cena” avança tanto para a “orchestra” que, sobretudo com o Festspilhaus (1876) de Bayreuth, a orquestra desaparece num fosso, para que só a música paire.

O que ocorre arquitectonicamente ao longo do século XX é, a nosso ver, uma reinvenção da “cena” por influência do “drama”. Na continuidade do drama romântico (que tanto queria que o público confundisse o palco e a vida) se acentuaria, afinal, a indefinição do que é “o palco” e do que é a “vida”.

Da Cena-bastidor se passa à Cena-palco, da Cena-palco se passa à Cena-sala, da Cena-sala se passa à Cena-rua. É preciso que as palavras mudem de sentido, peregrinem, para que as estranhemos e elas nos desautomatizem os rituais. Mas a evolução da expressão “in-Skéné”, cena em movimento, é uma metáfora das várias estratégias do teatro: oculta, avança e provoca, revela-se e confunde-nos por fim.

Sem comentários:

Enviar um comentário